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Como as folhas do plátano do Tremontelo que tremeluzem ao mais pequeno sinal de brisa e se desprendem, rodopiam até estabilizarem depositadas no chão. Se não se atenta bem, dá a impressão de se encher o plátano de passarada em divertida algazarra. Não é esse o caso, é apenas a festança alarve do folherio em trepidação fractal.
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Vou muitas vezes ao Tremontelo só a ver do correio. Ausências prolongadas levam à pronta saturação da caixa. A gente abre-a e atrás da portinhola vem um atropelo de cartas, de avisos, de papelinhos de ofertas de trabalho e toda a inutilidade de panfletos do Continente, do Aki, da Staples, do Mestre Mako, do Pingo Doce e de todas as catedrais e capelas do consumismo escalabitano. É uma trabalheira a separação da papelada em dois molhos no outro assento do carro. Depois, o acartar para o contentor azul. E vai-se tornando hábito!
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in O Lugar e os Monos
O aparecimento e a evolução da vida é um feito único e irrepetível de desafio à improbabilidade. Dizer "vida" é uma maneira de falar, pois tal coisa não existe. O que há são organismos vivos, que para se manterem nessa qualidade de vivos têm que se desenrascar, e, se o são, são-no por pouco tempo. A morte, a velhinha andrajosa com a gadanha na mão, é uma prosopopeia. Se a vida é organização é organização precária, pois cedo dá lugar à desorganização, ao retorno ao estado mineral.
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Escrever não é o meu forte atualmente. Até aqui, escrevia cartas que enrolava no interior de uma garrafa que lançava ao imenso mar da blogosfera. É aquela ideia muito antiga de que há, no infinito do universo, criaturas inteligentes capazes de decifrar os nossos sinais e suficientemente conscientes para entender os nossos gritos de alma. As minhas cartas destinavam-se a desconhecidos bem mais perto, situados na infinitude da nossa proximidade. Mas, ao ponto a que isto chegou, escasseiam os singulares humanos capazes de edificar um lugar nas suas existências, aptos a colocar máscaras que individualizem pessoas suportes de ação e prontos a resistir ao engolimento da realidade. A blogosfera foi arrasada pelas redes sociais, cemitérios da comunicação, do bom gosto e do património civilizacional.
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Tal não me acontecia há muito: uma calanzice inexplicável.
Após uma noite de sono curta, acordo com as primeiras clarezas do dia novo. Uma aclaração modorrenta de dia empastelado. Abro as portas de par em par e sinto a Farrusca pular do seu poleiro almofadado por cima da carcaça da velha lareira a pellets, que estorva no alpendre mas dá guarita à peluda que, no seu posto, me vigia as entradas e saídas. A cauda erguida, é sinal da dopamina que lhe endoidece o cérebro com a expetativa a realizar-se de comidinha e afagos. Põe-se a ronronar sabendo, de saber bem animal, que a oxitocina em breve me invadirá em golfadas, como a que sentem as amiguinhas que se encontram, também para descoser nas costas das outras, mas sobretudo pelo prazer que tiram de estar. Com o Agnus é outra coisa: